Diálogo com os tempos de outrora

Artigo publicado no Anais do I Encontro Regional do Rio de Janeiro sobre formação de professores para o Ensino da Arte.

Rio de Janeiro, UFRJ – 2010. p.153 a 161

 

Esse artigo tem como objetivo apresentar, ainda que breve, a origem da disciplina de Artes visuais no Colégio de Aplicação, que desde sua criação em 1948 já possuía em seu currículo esta disciplina, porém com o nome de Trabalhos manuais e uma proposta pedagógica diferente da atual. E visa promover o resgate e a memória da disciplina e o diálogo com tendências metodológicas do passado nos dias atuais. O Colégio de Aplicação foi criado em 1948, sendo o primeiro colégio de Aplicação do Brasil. Desde sua idealização a disciplina de Artes visuais está presente no currículo do Colégio, porém com o nome de Trabalhos manuais e com outra proposta pedagógica, diferente da atual. É possível conhecer em documentos da época presentes no acervo do PROEDES  na Faculdade de Educação – UFRJ, a trajetória e importância da disciplina desde sua criação nos planos de curso e relatórios realizados pelos professores e arquivados neste acervo. Em um plano de curso de  24 de setembro de 1948, a professora de trabalhos manuais Yone Sério de Oliveira expõe a importância das aulas de trabalhos manuais para os alunos como uma “educação profissional, espiritual e estética.”  As aulas eram direcionadas aos estudantes do curso ginasial e  a turma era dividida em grupos de meninas e meninos. O conteúdo curricular também era diferenciado, nas aulas de Trabalhos manuais educativos masculinos ministrados pelo professor Afonso Pereira, os rapazes aprendiam a preparar e conservar as ferramentas, a realizar trabalhos em madeiras e cartonagem. E nas aulas Trabalhos manuais e educação doméstica, as meninas aprendiam a costurar, bordar, fazer crochê, tricô, tapeçaria, enxovais, monogramas e etc. E também noções de nutrição, alimentação, puericultura, despesas domésticas , primeiros socorros, e modos de receber em casa, como a arrumação de mesas, a redação de convites e etc. No final do ano além das exposições dos trabalhos, a produção realizada nessas aulas era doada para instituições de caridades e maternidades.

O principal objetivo da disciplina era “a educação integral, preparando e adaptando as jovens para as exigências da vida moderna… onde a adolescente adquire noções básicas e práticas para sua atuação como mulher, no seio da família e sociedade”, conforme apresentou a professora Durvelina Santos no relatório da disciplina enviado ao diretor do CAp –UFRJ, Narciso Alves de Matos em 1951.

É necessário compreendermos o contexto social em que essas aulas e conteúdos eram ministrados, pois naqueles tempos de outrora a educação feminina através dos trabalhos manuais era fundamental na formação dessas alunas. Uma época em que o ensino dessas técnicas fazia parte dos vínculos de sociabilização primárias e eram apreendidos tanto esfera educacional  como também na esfera doméstica,  transmitidos de mães para filhas. As técnicas artesanais inculcadas e apreendidas no âmbito doméstico e educacional eram muito importantes na educação de uma moça no início e meados do século passado, fosse na forma de atributos essenciais para formação de uma moça de finos tratos, prendada esposa, boa  mãe e rainha do lar, tanto na formação e qualificação profissional de moças pobres, através de uma profissão socialmente permitida as mulheres como costureiras, bordadeiras e etc. Essas práticas cotidianas podem ser entendidas como o habitus, um princípio gerador de práticas classificáveis e  capazes de definir condutas e valores. Atualmente o contexto social e educacional é completamente diferente do apresentado acima. Inúmeras foram as metodologias e contextos em que a disciplina de Artes visuais esteve inserida desde a criação do CAp-UFRJ até os dias atuais.

A história da disciplina de arte-educação acompanha a própria história da educação no Brasil que é repleta de períodos diferenciados, tendências e metodologias, que no ensino de arte vão desde a tendência tecnicista passando pela livre-expressão, pela metodologia triangular e etc.

O CAp- UFRJ é reconhecido por ser uma escola que visa à experimentação metodológica. A prática pedagógica de seus docentes não está relacionada a nenhuma metodologia fixa ou pré-estabelecida, e desde a montagem do CAp estava presente a idéia de que o colégio deveria servir de laboratório de pesquisas no campo da educação secundária. Esta era a função pioneira dos colégios de aplicação das universidades americanas que serviriam de modelo para a implementação desse tipo de escola. (ABREU,1992) Havendo, portanto, uma liberdade para os professores e licenciados desenvolverem pesquisas e experimentações metodológicas em suas práticas docentes.   icone_download


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