As palavras, as coisas do bordado e essa coisa de design

Artigo publicado no Anais do IX Simpósio Interdisciplinar do LaRS: palavras e coisas.

Rio de Janeiro: Departamento de Artes e Design, PUC-Rio, 2011. p. 475-485

 

Este artigo tem como objetivo apresentar parte de uma pesquisa empírica realizada no ano de 2010 com bordadeiras tradicionais do Sertão Alagoano. E busca confrontar as palavras e as coisas do bordado com as palavras, representações e intervenções realizadas pelos órgãos e instituições promotoras do artesanato brasileiro, materializadas em catálogos de divulgação desses trabalhos.

Os trabalhos realizados nessas comunidades ribeirinhas ao Rio São Francisco são o bordado Rendendé em Entremontes e o bordado Boa Noite na Ilha do Ferro.

O povoado Ilha do Ferro pertence ao município de Pão de Açúcar, que está distante 240 km da capital Maceió, é um pequeno lugarejo banhado pelo rio São Francisco. O acesso a este povoado, que está distante 18 km do município de Pão de Açúcar, é feito por de barco ou carro, transporte menos usual visto a precariedade da estrada. O transporte fluvial é o mais utilizado pelos habitantes da localidade e a viagem dura um pouco mais de uma hora. Neste povoado vivem cerca de 200 famílias que extraem seu sustento da pesca, agricultura e as mulheres do bordado Boa Noite. Este nome deve-se ao tipo de ponto utilizado no bordado, que faz referência a uma flor local. As mulheres bordadeiras da Ilha do Ferro foram organizadas em uma cooperativa pelo Programa Artesanato Solidário.

A Art Ilha é uma cooperativa que possui 40 mulheres cadastradas que trabalham individualmente, mas compram o material coletivamente e uma parte da venda dos produtos é revertida para compra de novos materiais e manutenção da sede. Os insumos – tecidos e linhas vêem da cidade de São Paulo e as encomendas são enviadas para os compradores via Sedex.
A outra localidade visitada foi o povoado de Entremontes, distante 22 km do município que pertence , a cidade de Piranhas, distante 280 km de Maceió. Um povoado que também possui mais ou menos 200 famílias, e uma produção do bordado Rendedê muito expressiva, pois na pequena localidade a produção deste artesanato é muito desenvolvida. A maioria das mulheres, senão todas produzem o artefato. Na Associação de Bordados de Entremontes, 54 mulheres estão cadastradas e foram também organizadas pelo Programa Artesanato Solidário. Nesta localidade também existem outras associações de bordadeiras que não se mantiveram na associação organizada pelo Programa, por razões de atritos e conflitos entre as mulheres.

Essa pesquisa tem como objetivo conhecer, entrevistar e compreender o modo como vivem as bordadeiras e rendeiras tradicionais na contemporaneidade, frente à cultura de massa, tecnologia, industrialização e perda de valores e práticas artesanais e tradicionais.

Neste artigo pretendemos analisar o modo como o trabalho dessas mulheres é produzido, e o modo como ele é falado, representado pelos órgãos e instituições de apoio ao artesanato tradicional brasileiro, e ainda pretende realizar uma reflexão sobre a palavra e a coisa – a coisa e a imagem que é feita dela, de acordo com o tema “As palavras e as coisas” proposto pelo IX Simpósio do Lars. Essa pesquisa tem muitos desdobramentos e possibilidades reflexivas, porém aqui nos aprofundaremos no tema exposto acima.

 

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