Este artigo tem como objetivo apresentar e narrar a oficina de arte-educação realizada com trabalhadores da Associação de Catadores do Vale do Paraopeba – ASCAVAP – Brumadinho, MG.
O trabalho foi realizado em parceria com o Instituto de Arte Contemporânea de Inhotim a convite da Diretoria de Inclusão Social e Cidadania, que desenvolve ações de inclusão social em diversas comunidades e grupos ao redor do Instituto com o objetivo de fortalecer laços com eles, promover a cidadania, preservação e resgate de memórias de grupos tradicionais e apoio e orientação de políticas para geração de renda em grupos específicos. A oficina intitulada Intervenção poética em materiais coletados por catadores da ASCAVAP foi ministrada entre os dias 17 e 20 de maio de 2012, na Semana de Museus, uma ação do Instituto Brasileiro de Museus e cujo tema foi Museus em um mundo de transformação – novos desafios, novas inspirações.
O principal objetivo dessa oficina foi resgatar a dimensão emancipadora, crítica e sensível desses trabalhadores, através do contato com a arte. Propomos que com as sobras do mundo, aqui materializadas em resíduos sólidos descartados pela sociedade de consumo, que os participantes da oficina produzissem objetos carregados de um significado poético, lúdico e criativo, pensando suas práxis e instrumentos de trabalho a partir de uma ótica artística e estética, embebidos em formas criativas e despertando inúmeras possibilidades construtivas de intervenções e construções artísticas nos materiais coletados com linhas, bordados etc.
A culminância do trabalho foi uma intervenção artística com os materiais produzidos pelos participantes, formando uma grande teia na Capela de Santo Antônio, uma construção localizada dentro do Instituto de Arte Contemporânea de Inhotim e remanescente do antigo vilarejo que ali existia anteriormente à existência do museu.
Essa oficina integra os projetos e pesquisa que venho realizado ao longo da última década sobre as possibilidades de criação, resgate de memórias e histórias, o fortalecimento de autoestima e cidadania de grupos marginais através do resgate de práticas artesanais realizadas com linhas e agulhas, presentes no imaginário popular e no cotidiano do povo brasileiro, dialogando com a arte tradicional, popular e a arte contemporânea e seus inúmeros artistas que utilizam dessa temática em suas pesquisas conceituais e formais. Cabe ressaltar que esses projetos e pesquisa já foram realizados com mulheres idosas, rendeiras e bordadeiras tradicionais, alunos e alunas da educação básica e formação de professores em Artes Visuais, estes na Universidade Federal do Rio de Janeiro, instituição na qual sou docente e pesquisadora.
O trabalho realizado com catadores de resíduos sólidos foi de grande importância e aprendizagem, uma vez que os trabalhadores que compõem essa associação são antigos pacientes de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) do município de Brumadinho – MG, onde esse projeto de catação de materiais reciclados teve início como uma forma de geração de renda e trabalho. São, em sua maioria, portadores de sofrimento mental.
É importante compreendermos a função e a necessidade do oficio de catador de resíduos sólidos em nossa sociedade industrializada, que produz, consome e descarta objetos o tempo todo. Trata-se de refletir sobre a dimensão humana presente nesse oficio tão menosprezado pela sociedade contemporânea, uma práxis menor em que indivíduos são excluídos da participação social por serem miseráveis, tornando-se trabalhadores marginais. Uma gente que vive no meio de resíduos descartados pela sociedade que consome, sem parar noite e dia. Uma das questões levantadas desde o início foi a sobre a escolha dessa práxis: um indivíduo escolhe ser catador ou é escolhido pelas condições adversas e presentes na sociedade capitalista, que degenera trabalhadores e suas práticas criativas e necessárias a condição humana digna?
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